Como é triste a velhice! Sobre
a tristeza da perda física
e intelectual que o passar dos anos
inexoravelmente causa a qualquer ser
humano, o que parece prevalecer mais
no idoso é a tristeza maior
pela falta da atenção
que lhe é devida, especialmente
da parte daqueles que dele são
extensão vital, daqueles que
ajudou a crescer, a conhecer com carinho
os caminhos da vida. Magoa muito a
reação de quem vê
o velho com dificuldade, sem a tolerância
necessária, como se ele fosse
um estorvo, um problema de cuja solução
não mais se possa tirar qualquer
proveito.
Se recordar também é
viver, as boas lembranças de
uma vida anterior dinâmica e
feliz, quando as invade essa tristeza
maior, acabam por ficar muito confusas
e amargas, uma vez que se misturam
na fusão passado-presente as
mesmas pessoas em atitudes diversas,
que fazem sublinhar o desrespeito,
a ingratidão e a hipocrisia.
O idoso então olha o horizonte,
sem de fato o ver, como se ele fosse
além com o olhar, para perscrutar
o próprio Além, para
tentar preexaminar o espaço
que o espera, em nova fase, que só
pode ser melhor. Mas o que machuca
mesmo nesse olhar longínquo
é a carga imensa de decepção
com o mundo que vai ficando para trás.
Porque os semelhantes, em geral de
memória curta, esquecem facilmente
o mérito pessoal e profissional
desse idoso e, com injusto comportamento,
o relegam praticamente ao abandono.
Tal esquecer se torna ainda mais lamentável,
porque olvida também que os
velhos de amanhã hão
de ser os próprios moços
de hoje e, portanto, com esse tipo
de atitude, podemos estar agindo,
não só sem a consciência
do passado, mas principalmente sem
a perspectiva do futuro.
Num país jovem como o nosso
é preciso pensar mais no problema
da velhice, a fim de que, em boa preparação
para os nossos dias finais, aprendamos
a cuidar melhor de nossos velhinhos,
com mais amor, com mais carinho, com
mais atenção e tolerância,
com maior reconhecimento do que representaram
em sua idade ativa. Esse direito deles
tem de entrar na rotina afetiva de
qualquer lar, como seqüência
natural dos problemas de uma casa
bem formada, porque isso significa
valorizar a experiência e fortalecer
os laços familiares.
Se, praticando em instantes difíceis
o verdadeiro sentimento de amizade
familiar, conseguirmos superar com
boa vontade as dificuldades que, obviamente,
trazem as fases avançadas de
uma vida decadente – sem que
tenha ela o constrangimento de verificar
que nisso está havendo um esforço
de exceção – havemos,
pelo menos, de permitir que esse idoso
leve deste mundo a sensação
de uma doce alegria última
e a idéia de uma perspectiva
melhor para as novas gerações,
em seus momentos derradeiros.
(A GAZETA DO VALE – 23/09/93)